"Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza". (Boaventura de Souza Santos)

terça-feira, 29 de junho de 2010

Pediátrico ajuda a descobrir novos genes na origem do autismo

O Hospital Pediátrico de Coimbra integra o consórcio internacional que investiga as causas genéticas do autismo. A equipa de investigadores provou que existem vários genes envolvidos no autismo e que estes podem ser diferentes,de caso para caso como explicou ao Diário de Coimbra a pediatra Guiomar Oliveira

Avanços na investigação sobre o genoma do autismo foram recentemente publicados na revista Nature. Que tipo de investigação é esta e como surge a participação da equipa do Hospital Pediátrico de Coimbra?
Guiomar Oliveira (GO) - Trata-se de um investigação internacional sobre a procura dos genes de susceptibilidade para o autismo, ou seja dos genes que possam ser a causa do autismo. O Hospital Pediátrico de Coimbra em parceria com o Instituto Gulbenkian de Ciência e o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge fazem esse tipo de investigação desde o final da década de 90 e apresentam trabalhos publicados nas revistas cientificas internacionais desde 2000. Uma vez que o consórcio internacional se formou em 2002, Portugal como país reconhecido na investigação desta área foi incluído neste grupo de investigadores líderes mundiais. Este consórcio internacional, o Autism Genome Project Consortium [Consórcio do Projecto do Genoma do Autismo] é constituído por 120 cientistas, provenientes de mais de 50 instituições, representando 11 países, sendo co-financiado por várias instituições internacionais (Autism Speaks, National Institutes of Health, Medical Research Council, Canadian Institutes of Health Research, Health Research Board Ireland, Genome Canada e Fundação Hilibrand).

Quais foram, resumidamente, as novas descobertas?
GO - Desde os anos 70 que a comunidade cientifica reconhece a origem genética do autismo. Especulava-se então que, numa percentagem elevada de casos, a mutação genética na base do autismo seria monogénica e a mesma, ou seja só provocada pela alteração de um gene, à semelhança do que acontece no síndrome de Rett ou no Síndrome de X frágil. Contudo os estudos do rastreio do genoma dos anos 80 e 90 vieram demonstrar que o autismo seria de causa poligénica, ou seja com muitos genes envolvidos em simultâneo e diferentes de caso para caso. O que este estudo publicado na Nature veio confirmar foi isso mesmo.

De que forma?
GO - Comparando o grupo de autismo (mil indivíduos) com um grupo saudável (1.300), o grupo com autismo apresentava mais frequentemente no seu genoma alterações submicroscópicas de delecções (perda de material genético) ou duplicações (ganho de material genético) de grandes fragmentos de ADN designadas como Copy Number Variants (CNVs), que provocam alterações em vários genes, sendo que a maioria destes genes está envolvida do desenvolvimento e funcionamento do cérebro. O estudo demonstrou também que as alterações genéticas verificadas são muito variadas (localizadas em diferentes cromossomas) e diferentes de indivíduo para indivíduo, que “per si” explicam menos de um por cento dos casos, mas que em conjunto explicarão uma maior percentagem deles. Algumas destas alterações são herdadas dos pais, outras das mães e em alguns casos surgiram pela primeira vez no indivíduo com autismo.

Que expectativas nos trazem para o futuro, seja ao nível de novas linhas de investigação seja mesmo no desenvolvimento de terapêuticas?
GO - Estes resultados demonstram que diferentes alterações genéticas dão origem ao mesmo síndrome clínico, neste caso o autismo, o que significa que haverá diferentes vias metabólicas/bioquímicas disfuncionais que se interligam para dar as alterações neurocomportamentais e cognitivas que caracterizam o autismo. São muito importantes estes achados porque, percebendo os genes que estão envolvidos, poderemos conhecer melhor a sua função e depois intervir farmacologicamente de um modo atempado no “nó” disfuncional, evitando assim um efeito em cascata anómalo do desenvolvimento neurológico.

O Hospital Pediátrico tem desenvolvido um trabalho pioneiro na área do autismo...
GO - O Hospital Pediátrico Coimbra criou a primeira consulta de autismo no país em 1992. Em parceria com a Direcção Regional da Educação do Centro (DREC), no ano lectivo 1996/97, abriu a primeira Unidade de Ensino Estruturado para crianças com autismo, sendo que hoje já existem unidades em todas as regiões e estão contempladas na lei da educação especial de 3/2008, usando como modelo Coimbra. Actualmente, no Hospital Pediátrico, em parceria com a DREC, funciona uma unidade de autismo com características multidisciplinares (médicos, professores, psicólogos, terapeutas, técnicos de serviço social e enfermeiras). A unidade responde a cerca de 1.800 consultas por ano (10 por cento das quais são primeiras consultas) e segue mais de mil utentes, metade residem fora da região Centro.

Qual a incidência estimada de perturbações do espectro autista no nosso país?
GO - Uma em cada mil crianças de idade escolar sofre de autismo tal como demonstrado no estudo de prevalência realizado em 2000 em Portugal, justamente pela equipa de Coimbra (Epidemiology of autism spectrum disorder in Portugal, Guiomar Oliveira e al, Developmental Medicine & Child Neurology 2007)

Quais as principais preocupações dos profissionais de saúde nesta área?
GO – Preocupa-nos a falta de recursos para responder às exigentes e especificas necessidades de intervenção a nível escolar e depois, mais tarde, de protecção social.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Alterações no número de cópias de genes podem explicar autismo

Duplicações ou deleções de parte do genoma podem estar por trás de parte dos casos de autismo. Essa é a conclusão de um estudo publicado na revista Science.

Esse tipo de mudanças no genoma pode alterar o número de cópias de um determinado gene. Variações no número de cópias de um gene são dez vezes maiores em crianças autistas que em outras crianças.

A equipe do Laboratório Cold Spring Harbor, em Long Island, Nova York, liderada por Jonathan Sebat, examinou 118 famílias com uma criança autista e 99 famílias com nenhuma criança autista.

Do grupo de crianças autistas, 10% tinham variantes no número de cópias de genes que não apareciam nos genomas de seus pais, contra 1% no grupo de crianças não autistas.

A variação no número de cópias afeta genes diferentes em cada criança autista. Isso sugere que o autismo não é causado por um único defeito genético.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Descobertos novos genes raros do autismo

Projecto internacional, que integra investigadores edoentes portugueses, abre portas a diagnóstico precoce
Ontem
GINA PEREIRA
Novos genes de susceptibilidade para o autismo e variantes raras do genoma foram identificados em doentes autistas, muitos deles encontrados apenas no indivíduo e não nos pais. Os resultados constam de um estudo internacional, em que Portugal participa.

É o maior estudo jamais realizado sobre autismo e envolve cerca de mil doentes com perturbações do espectro do autismo, entre eles cerca de 300 crianças portuguesas que são seguidas no Hospital Pediátrico de Coimbra. Os novos resultados do Autism Genome Project (AGP), consórcio internacional criado em 2002 e constituído por 120 cientistas provenientes de 11 países, entre os quais Portugal, são hoje publicados na revista científica "Nature". E abrem a possibilidade de, no futuro, poder haver um diagnóstico precoce molecular do autismo.

O que os investigadores conseguiram agora identificar foi que os pacientes com autismo tendem a possuir no seu genoma mais alterações submicroscópicas - designadas Copy Number Variants (CNV's) - do que os indivíduos controlo. E que muitas destas alterações no ADN não são herdadas dos pais, mas correspondem a alterações dos cromossomas do próprio indivíduo, como acontece na Trissomia 21. As causas para o aparecimento dos CNV's não são ainda bem conhecidas, mas verifica-se que podem incluir entre um a 20 genes, parte dos quais já se sabe serem importantes no autismo ou na deficiência mental.

Outra das descobertas dos investigadores é que, enquanto isoladamente cada uma destas alterações é rara - isto é, responsável por uma fracção diminuta de casos de autismo - no seu conjunto estas variantes poderão levar à doença numa grande percentagem dos indivíduos afectados. O que acentua a convicção dos cientistas de que "existe uma enorme variabilidade genética na base do autismo", disse, ao JN, Astrid Vicente, investigadora-principal da Unidade de Investigação e Desenvolvimento de Promoção da Saúde e Doenças Crónicas do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), que participa neste projecto.

Num "futuro longínquo", o que estes resultados podem vir a permitir é que passe a existir um teste molecular que permita fazer um diagnóstico mais precoce do autismo, visto que actualmente o único diagnóstico que existe é comportamental. Por norma, os pais têm de esperar até aos dois/três anos para terem a certeza de que os comportamentos dos filhos correspondem a um diagnóstico de autismo.

Guiomar Oliveira, médica do Hospital Pediátrico de Coimbra que também participa no estudo, admite que esse diagnóstico possa vir a permitir "tirar dúvidas mais precocemente", mas o que aponta como mais relevante neste estudo é o facto de apontar "causas até então desconhecidas". "É um avanço enorme", diz, garantindo que "todos os dias" tem estado a encontrar respostas para casos de meninos cujo autismo não tinha qualquer explicação, o que acontecia em 80% dos casos.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Pesquisadores testam medicamentos para combater sintomas de autismo

NEW SCIENTIST


Pesquisadores estão desenvolvendo novas drogas para melhorar as dificuldades sociais de autistas e de outras pessoas com dificuldades de aprendizado.

As únicas drogas prescritas no momento para autistas agem na redução da agressão e ansiedade, mas não atacam as causas do problema. As novas drogas, no entanto, poderiam atacar o cerne do problema.

"As pessoas podem aprender mais, a falar melhor, a interagir com outras pessoas e ser mais comunicativas", diz Randall Carpenter da empresa Seaside Therapeutics em Cambridge, Massachusetts (EUA), que está testando uma droga dessa nova classe.

O entusiasmo é compartilhado por Geraldine Dawson, cientista-chefe da instituição beneficente Autism Speaks e psiquiatra na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hills (EUA). "Pela primeira vez, estamos vendo medicamentos que poderiam lidar com sintomas essenciais do autismo."

O teste da Seaside Therapeutics é destinado a pessoas afetadas pela síndrome do X frágil, doença genética associada com o autismo. Pessoas com a síndrome possuem uma mutação em um gene envolvido no fortalecimento de conexões cerebrais ligadas a experiências salientes. Conexões mais fortes permitem que se consiga distinguir eventos relevantes de eventos irrelevantes (ou seja, permite o aprendizado). Mas a mutação no gene dificulta esse processo.

Uma equipe de pesquisadores da Seaside Therapeutics, liderado por Carpenter, está testando uma droga chamada arbaclofen que parece ser capaz de reverter os efeitos dessa mutação.

Carpenter apresentou os resultados em um encontro de pesquisadores da área na Filadélfia no dia 23 de maio.

Os resultados do trabalho sugerem que a nova droga pode melhorar habilidades sociais de pessoas com a síndrome do X frágil e autismo, incluindo melhora na comunicação e sociabilidade em geral e menos episódios de acesso de raiva.

Outra substância que pode ajudar no tratamento é o hormônio ocitocina. Já se sabe que a substância parece conectar sensações de prazer ao contato social. Por causa disso, diversos grupos de pesquisa estão usando a ocitocina em testes para reduzir os sintomas do autismo.

No encontro da Filadélfia, uma equipe liderada por Evdokia Anagnostou, neurologista infantil do Instituto de Pesquisa Bloorview em Toronto, Canadá, apresentou um trabalho mostrando que a administração de duas doses diárias de ocitocina por seis dias aumenta a capacidade de reconhecer emoções e o funcionamento social de outras pessoas.

Segundo a psicóloga Uta Frith, do University College London, na Inglaterra, esse tipo de abordagem química no tratamento de autismo é algo ainda muito novo. Para Frith, seria muito bom que drogas pudessem atacar as causas da doença, mas enquanto elas não vêm, intervenções comportamentais ainda são uma das melhores alternativas.