"Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza". (Boaventura de Souza Santos)

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Experimento consegue reverter autismo clássico em células

Por Aline Naoe (colaborou Adriana Lima)
19/01/2012



Em 2010, a equipe do cientista brasileiro Alysson Muotri recebeu destaque internacional após a publicação de uma descoberta na capa da revista Cell. Muotri, professor da faculdade de medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, e seu grupo conseguiram produzir neurônios a partir de células de pessoas com autismo, identificar diferenças desses neurônios em relação a neurônios normais e, ainda, reverter o autismo dos neurônios, abrindo caminhos para o desenvolvimento de remédios para o tratamento desse distúrbio.

As células utilizadas nos experimentos eram de pacientes com Síndrome de Rett, uma forma mais grave de autismo. Recentemente, o grupo liderado por Muotri reproduziu o experimento e obteve os mesmo resultados utilizando células de pacientes com o autismo clássico, identificando fatores em comum entre os dois tipos de autismo. Os resultados estão em fase de revisão e devem ser publicados ainda neste ano.

Desta vez estudo conduzido envolveu crianças diagnosticadas com autismo clássico, pacientes do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. “Em um desses pacientes achamos um novo gene, o TRPC6, que nunca havia sido associado ao autismo”, afirma Muotri. Esse gene interage com o MECP2, o gene da Síndrome de Rett, revelando que tanto o autismo clássico como essa síndrome dividem as mesmas vias moleculares. “São dois tipos de autismo levando à mesma alteração celular e nós definimos qual a via molecular que causa isso”, completa.

Segundo Muotri, tanto o autismo clássico como a Síndrome de Rett apresentam como sintomas problemas sociais e de linguagem. Além disso, os neurônios desses dois tipos de autismo apresentam número reduzido de sinapses e número reduzido de espinhas neuronais, o que sugeria vias moleculares comuns, confirmadas pelo estudo. Drogas usadas ajustar o numero de sinapses em neurônios derivados de pacientes com a síndrome de Rett também funcionaram em alguns pacientes com autismo clássico. “Estamos num nível em que os experimentos precisam ser reproduzidos em humanos, em ensaios clínicos. Existem grupos que atuam nos EUA e Itália que já estão iniciando esses experimentos”, comenta o cientista. Segundo Muotri, esses pesquisadores já têm a intenção de realizar testes em crianças com outras síndromes além da de Rett.

As drogas utilizadas para a reversão do autismo nos neurônios, no entanto, ainda precisam ser aperfeiçoadas. “Essas drogas ainda não são específicas o suficiente. Além disso, são moléculas grandes, ou seja, não atravessam de maneira eficiente a barreira da membrana do cérebro, a penetração é muito baixa”, relata Muotri. Atualmente, o biólogo está buscando moléculas menores para esse tratamento, que venham a compor medicamentos com menos efeitos colaterais.

Muotri esteve no Brasil para participar da Escola São Paulo de Ciência Avançada: Avanços na Pesquisa e no Tratamento do Comportamento Autista, evento organizado pela UFSCar no início de janeiro, onde apresentou suas pesquisas sobre a genética do autismo. Essa abordagem ajuda a desmistificar a antiga ideia de que problemas como o autismo são causados pela falta de cuidado dos pais e que têm origem unicamente no ambiente.